O que é a dislexia?
A dislexia do desenvolvimento ou transtorno específico de leitura compreende 80% dos transtornos de aprendizagem e compromete a aquisição e desenvolvimento da leitura e, consequentemente da escrita. É uma dificuldade inesperada na aquisição de leitura para as habilidades cognitivas (inteligência), motivação e escolaridade (acesso educacional). Atinge em torno de 10% da população, sendo mais frequente em meninos. As principais características de dislexia são: a) Dificuldade na identificação de símbolos (letras) – confusão de letras espacialmente semelhantes (d/b/q/p, n/u, a/e) ou com sons semelhantes (f/v, d/b, b/p); dificuldade de reconhecimento do que é direito e esquerdo. b) Dificuldade de aprender a relação entre as letras e seus sons, identificação dos sons das palavras, separação silábica de palavras (a-ma-nhã) e identificação de rimas após quatro anos. c) Leitura lenta e silabada, apesar de acesso a um processo adequado de alfabetização. d) Na leitura e escrita, observam-se inversão de sílabas ou palavras (pote/tepo); substituição de palavras com estrutura semelhante (caminho/caminhão); supressão ou adição de letras; repetição de sílabas ou palavras; fragmentação incorreta (Ler é fundamental/ lere fun damen tal). e) História familiar de transtorno de déficit de atenção/hiperatividade e dislexia. É o conjunto de sinais e sintomas que permite suspeitar de dislexia do desenvolvimento e não apenas um sintoma isolado.
O que causa a dislexia?
Existe uma forte herança genética, mas nenhum gene único foi identificado. A história familiar é considerada como o principal fator de risco para dislexia. Estes fatores genéticos são moldados por fatores ambientais como famílias que têm acesso à educação de qualidade.
Há forma de prevenção?
A prevenção seria por meio da identificação de grupos de risco e sinais precoces de dislexia na idade pré-escolar. Na literatura médica são considerados grupos de risco para transtornos de aprendizagem: história familiar de transtorno de aprendizagem e/ou déficit de atenção/hiperatividade (TDAH), uso de álcool ou fumo na gestação, prematuridade, peso de nascimento igual ou menor a 2500 gramas, atraso na aquisição e desenvolvimento da linguagem, além de certas patologias como diabetes mellitus, anemia falciforme, HIV, epilepsia, neurofibromatose tipo1, esclerose tuberosa, Turner, tiques, transtorno de humor bipolar e TDAH.
A dislexia incide apenas em crianças?
No início da alfabetização, por volta dos 6 anos, é quando as maiores dificuldades se iniciam e a leitura se torna um desafio.
Qual é o perfil de pacientes mais acometidos pela dislexia?
Não há estudos de prevalência no Brasil, porém estima-se a incidência em 10% da população segundo a Organização Mundial de Saúde.
Com se dá o diagnóstico?
O diagnóstico é clínico, fundamentado por avaliações e informações de todos os envolvidos (criança, família, educadores e profissionais envolvidos). Existe necessidade de uma equipe multidisciplinar com experiência e conhecimento em transtornos de aprendizagem. A equipe deve ser constituída por médicos (pediatra, neurologista ou psiquiatra), neuropsicóloga, fonoaudióloga e psicopedagoga. Os indivíduos são avaliados por testes individualizados, cujos resultados são analisados conjuntamente. Devem ser descartados deficiência intelectual, problemas pedagógicos, déficits visuais e auditivos; sendo essencial o diagnóstico de condições associadas (comorbidades) como TDAH, ansiedade, depressão, entre outros.
Dislexia tem cura?
Como em outras condições como a hipertensão arterial e diabetes, a dislexia não tem cura, mas existe tratamento. As dificuldades podem perdurar por toda vida se não adequadamente abordadas.
Se não tem cura, o que é possível fazer para que a criança possa aprender ler e possa ter um desenvolvimento considerado normal?
A abordagem deve partir do diagnóstico correto e escolha da melhor estratégia terapêutica. Não existe “receita de bolo”. Cada criança é única com diferentes aptidões e necessidades. A educação e participação dos familiares no tratamento são fundamentais para melhor futuro destas crianças. Ambientes educacionais motivadores que incentivem o esforço e se adaptem as necessidades destas crianças são fundamentais. Em relação à alfabetização, é consenso que a abordagem fônica, baseado na relação letra-som, é o melhor método de ensino. Deve-se associar à prática de leitura (construção de fluência e vocabulário), o ensino de estratégias explícitas de compreensão de leitura.
O tratamento exige atuação de vários profissionais?
A equipe multidisciplinar deve ser composta por profissionais experientes na área educacional, formada por médicos, psicopedagogos, fonoaudiólogos, psicólogos, terapeutas ocupacionais de acordo com a necessidade individual de cada criança. Esta equipe conjuntamente com a escola e os responsáveis/familiares poderão realizar uma avaliação mais completa e um diagnóstico e tratamento adequado. É fundamental que a equipe esteja integrada entre si, com a família e escola.
O que os pais devem observar nos seus filhos como formar de tentar identificar a dislexia, mais precocemente?
Os sinais precoces podem ser observados desde muito cedo como alterações nas habilidades relacionadas à linguagem como dificuldade de articulação dos sons da fala, vocabulário restrito, dificuldade de nomeação e de recontar histórias, dificuldade de fazer rimas após os 4 anos. Podem também apresentar dificuldades na identificação de símbolos (letras, números) e noção corporal.
Além do prejuízo no desenvolvimento do aprendizado escolar, que outros impactos a dislexia pode causar na vida da criança?
Devemos lembrar que primeiro aprendemos a ler e depois lemos para aprender. A leitura é a principal fonte de conhecimento na vida moderna. As dificuldades na leitura e sua compreensão impactam negativamente o indivíduo em todas as esferas seja acadêmica, social e emocional. O fracasso e evasão escolar são frequentes entre os indivíduos não tratados.
Como pais, colegas e professores podem auxiliar a criança que está se tratando a superar suas limitações?
São três pontos fundamentais:
1) Os transtornos de aprendizagem se apresentam de formas diferentes em cada criança. Cada criança é única com seus pontos fortes e a serem desenvolvidos;
2) Deve-se ter um entendimento científico dos transtornos tanto no diagnóstico quanto no tratamento. Nenhum problema emocional leva à dislexia, mas dificuldades na aprendizagem levam a problemas emocionais. Tratamentos experimentais sem fundamento científico devem ser evitados. Tais atitudes equivocadas só aumentam a ansiedade e frustração destas famílias;
3) O tratamento é educacional. Não existem “soluções mágicas”. A criança deve ser submetida a uma abordagem de curto, médio e longo prazo. A criança deve vencer as etapas de decodificação (letra-som), fluência e compreensão de leitura. Em cada fase, a criança necessitará de adaptações e acomodações diferenciadas como fazer provas orais, evitar provas de múltipla escolha e usar mídias no processo de aprendizado.
RESPONSÁVEL:
Cláudia Machado Siqueira
Neurologista e pediatra
CRM-MG: 28367