“É preciso roubar uma parte da vida para dedicar aos sonhos, aos ideais e às realizações que não queremos que morram conosco”
Sob o peso das palavras de José Salvador, fundador da Rede Mater Dei, seu filho Henrique Salvador preside hoje a Instituição prestes a completar 40 anos
A alguns meses de completar 40 anos, a Rede Mater Dei chega a 2019 com três unidades em Minas Gerais e o primeiro ponto fora da curva já em vista para os próximos anos: o Mater Dei Salvador, primeiro Hospital do grupo fora do Estado.
O projeto de 60 mil m² com panorama em 180º para o mar é assinado por Siegbert Zanettini, consagrado arquiteto criador de vários projetos para a Rede. O novo Hospital será um edifício de 100 metros de altura, com 24 pavimentos, heliponto, e capacidade de 370 leitos operantes. O Hospital, que vem acompanhado por um Centro Médico Integrado de Saúde com quase 10 mil m² e a poucos minutos de distância, reafirma a Rede como um dos expoentes da Saúde nacional.
Em Belo Horizonte, a unidade Santo Agostinho, primeiro dos hospitais Mater Dei, é o segundo no país a conquistar o selo ONA Nível III. Desde junho de 1980, a Rede mantém os preceitos de fomento à cultura, ciência e humanismo em sua atuação e se tornou referência na profissionalização da gestão enquanto organização familiar.
O foco, hoje, reitera o Henrique Salvador, presidente da Rede Mater Dei, é ajudar a solucionar, através da inovação, pesquisa e tecnologia, alguns dos principais problemas da Saúde, que ultrapassam fronteiras estaduais e nacionais. Como? Da mesma forma que chegou até aqui; com investimentos bem direcionados, visão de longo prazo e responsabilidade para com os resultados, nas mais diversas dimensões.
1. Quais as expectativas para a primeira unidade interestadual da Rede?
O Mater Dei Salvador deverá ser inaugurado em 2022, como parte de uma agenda de crescimento, com uma estruturação financeira que envolve recursos próprios e recursos de bancos de fomento. Faz parte de um crescimento orgânico sustentável que, na verdade, não é apenas um crescimento financeiro. Há diversas construções para inaugurar um hospital, da obra em si aos relacionamentos. É essencial ter um corpo clínico, por exemplo, que queira crescer junto. Sempre faço essa analogia; é como se o prédio fosse o corpo, e as equipes fossem o espírito da instituição. No dia da inauguração, tudo isso deve estar alinhado.
2. De quais formas a Rede fomenta esse crescimento dos relacionamentos internos?
Nós temos hoje um programa de residência que forma, anualmente, 70 residentes em conjunto com o MEC. Além disso temos um centro de formação institucional para a formação de técnicos de enfermagem e pós-graduação de enfermeiros com nível superior. Temos hoje ainda 250 estagiários não assistenciais, de áreas de apoio, engenharia; montamos um banco de talentos que permite o crescimento. Queremos crescer fazendo sentido; fazendo a diferença na vida das comunidades onde estamos. Um dos nossos principais valores é justamente gerar valor para a sociedade. Há uma pergunta que faço sempre: “Se o Mater Dei não existisse, faria diferença para a comunidade onde estamos?” Se a resposta for “não”, temos um problema muito sério. Mas se for “sim”, para muita gente faria falta, faria diferença, então estamos no caminho certo. Isso tudo se une na nossa forma de governança.
3. E qual a forma de governança adotada pela Rede?
Hoje, somos três gerações trabalhando juntas. O fundador, meu pai, que aos 88 anos preside o conselho. A segunda geração, eu, presidente, e minhas duas irmãs, vice-presidentes. E já temos um time de filhos e sobrinhos chegando, muito bem qualificados, tendo trabalhado no mínimo três anos em outros hospitais em São Paulo ou no Rio Grande do Sul, fizeram MBA nas principais escolas do mundo. Quando digo que precisamos ter massa crítica de talentos e de gente boa no que faz, o exemplo tem de vir de cima. Acho que talvez um dos principais pontos de diferencial do Mater Dei seja justamente este; são familiares atuando como profissionais e profissionais atuando como familiares. Os profissionais também passam a fazer parte de uma grande família; temos pessoas que estão com a gente há 20, 30 anos, por exemplo.
4. Como a Rede Mater Dei define seus investimentos em inovação?
Há dois anos fundamos o Núcleo Interno de Inovação, chamado Inovater, que tem basicamente duas grandes finalidades. A primeira é analisar que tipo de incorporação tecnológica precisamos fazer no momento para melhorar nossa eficiência e eficácia operacional no mundo em que vivemos atualmente. A segunda é definir como devemos pensar no futuro; o que vai ser o hospital do futuro? Como a Rede Mater Dei precisa se estruturar, se movimentar, para enfrentar os desafios que vêm pela frente? A partir daí, definimos onde devemos investir.
“O exemplo é preciso. Não é plausível que eu diga algo e aja diferente daquilo. Devemos nos perguntar: tem congruência entre aquilo que a diretoria prega e aquilo que ela efetivamente faz? A governança, tem sentido?” Henrique Salvador, presidente da Rede Mater Dei
5. Quais são os principais desafios que a Saúde enfrenta atualmente?
Nós temos, hoje, no mundo todo, alguns desafios macro. Os principais são o envelhecimento da população, tecnologia e custos elevados. Hoje, as pessoas estão ficando mais velhas, e a questão já deixou de ser o quanto a mais vai se viver, passando para, principalmente, a qualidade de vida que as pessoas terão ao viverem mais. E isso desencadeia diversas questões complicadas, como o aparecimento de doenças crônicas e degenerativas, algo próprio da condição humana para que precisamos nos preparar.
6. Como a Rede tem trabalhado para enfrentar os desafios impostos pela tecnologia?
As pessoas estão muito ligadas à tecnologia, e ao mundo de forma geral, de maneira muito instantânea, o que leva a população a protagonizar mais as questões relacionadas ao seu atendimento e ao monitoramento de suas próprias doenças. Precisamos estar preparados para atender a este novo tempo, que é quase uma nova civilização. Hoje, a partir do Inovater, temos dois aplicativos médicos. Um deles, desenvolvido em parceria com a MV Sistemas, possibilita ao médico prescrever, evoluir o paciente, entre outras funções, a partir do momento em que entra no hospital. O outro, desenvolvido em parceria com a equipe interna do setor de Tecnologia e Informação, é um dispositivo que chamamos de “painel do paciente”. Nele, o paciente interage com seu próprio prontuário, possibilitando que ele faça perguntas sobre o que se trata o tratamento que está recebendo, e conheça os profissionais de saúde que o atendem.
7. É possível dizer que esta interação do paciente com seu PEP é uma forma de humanização?
Sim! Há um estudo muito interessante, mostrando que apenas 35% dos pacientes sabem de fato o nome dos profissionais da equipe de saúde que o atendem. Então, estamos desenvolvendo questões muito próprias para poder humanizar e acolher melhor o paciente. Por exemplo, a partir do conhecimento que o painel traz, ele pode questionar os efeitos colaterais de alguma droga que esteja tomando, e até acompanhar sua evolução clínica durante a internação. É algo que acompanha a tendência à conectividade, e permite que os pacientes estejam mais engajados com seus tratamentos. Há, inclusive, pesquisas que mostram claramente que um dos segredos para a redução de eventos adversos durante a internação é justamente o engajamento, não apenas do paciente, mas de sua família também.
8. Falamos de dois dos três desafios citados; e como vencer a questão dos custos?
O terceiro é a questão dos custos de saúde. Os países, hoje, gastam cada vez mais percentuais de seus PIBs com Saúde, e isso precisa ter um fim. E não estou sequer falando de países desorganizados; visitei recentemente a Holanda, que gasta 11% do PIB com Saúde, sendo uma das melhores saúdes da Europa, com um sistema muito organizado que atende 17 milhões de pessoas e uma porta de entrada muito bem regulada através do médico de família. Mas, ainda assim, gasta 11% do PIB para tornar isso possível, devido às duas outras questões: o envelhecimento da população e a necessidade de conectividade e incorporação tecnológica. Então, o terceiro desafio, basicamente, é aprender a lidar com os custos da área. É um desafio mundial, que independe da forma como os países se organizam; é uma questão de custo-benefício das ações.
9. E esta, digamos, “revolução tecnológica” coloca a Saúde tradicional em xeque?
Como disse, as pessoas passaram a querer com mais afinco serem donas de seus desígnios e protagonizar aquilo que é importante para sua saúde. E, hoje, o acesso às informações de Saúde através da internet é extremamente facilitado. No Google, cada vez mais, há mais informações certeiras do que errôneas, inclusive. É possível acessar informação de boa qualidade, de graça. Nos Estados Unidos, visitei a Apple e alguns centros médicos que me impressionaram muito em relação como tratam essa questão da tecnologia. A partir da conectividade apresentada por eles, tanto de médicos quanto de pacientes, inspiramos a desenvolver alguns projetos.
10. Como o Mater Dei acompanha a qualidade de sua atuação?
Nossa construção da Saúde Baseada em Valor começou em 2003, quando eu ainda era Diretor Clínico e Técnico do Hospital. Começamos, de maneira pioneira no Brasil, um programa de governança clínica e gestão do corpo clínico que, inclusive, se tornou um livro, publicado junto a outros dois autores, sobre a questão da experiência dos hospitais da Anahp. Estabelecemos em 2003, portanto, uma governança na qual as equipes médicas, baseadas em protocolos assistenciais e em análises críticas de resultados, estabelecia metas e métricas; passamos a acompanhar os resultados assistenciais regularmente.
Publicado em: 19/11/2019