Henrique Moraes Salvador Silva
Presidente da Rede Mater Dei de Saúde
Quem vive o dia a dia de um hospital sabe que os processos envolvidos na assistência ao paciente se iniciam a partir da orientação médica. A partir do que o médico solicita e evolui no prontuário do paciente, ocorre o trabalho as equipes de Enfermagem, Serviço de Apoio Diagnóstico, da Farmácia, entre outros profissionais. Apesar destas importantes relações entre a atenção do médico e a assistência, percebe-se que pouco se evoluiu ao longo de décadas na estruturação de sistema de gestão que integrem as duas inteligências que coexistem nas organizações hospitalares: a gestão empresarial e a gestão assistencial. Recentemente o tema entrou na pauta dos gestores de todo o Brasil. É a chamada governança interativa em que os saberes se complementam visando a integração da Governança Corporativa à Governança Clínica. Para nós este sempre foi o caminho para se conseguir uma prestação de serviços de qualidade. Talvez pela nossa formação mista de médico e empresário/gestor hospitalar temos a visão crítica, de ambos os lados. Para nós vale a pena investir tempo, energia e recursos para se desenhar e se desenvolver um modelo de gestão do corpo clínico que gere uma sinergia entre os diversos profissionais e integre o sistema de gestão organizacional.
No Mater Dei, ainda na década de 90, iniciamos um processo pioneiro no Brasil que possibilitou, entre outras coisas, hoje sermos uma Rede composta pelo Mater Dei Santo Agostinho, Mater Dei Contorno e, em breve, Mater Dei Betim – Contagem. Foi um modelo que propiciou e ainda gera o engajamento e empoderamento dos membros do corpo clínico.
Em 1996, após mais de quatro anos de investimento em capacitação da direção e das gerências, o Mater Dei implementou um modelo de gestão baseado nos princípios da Fundação Dom Cabral (FDC) por meio do Paex – Parceiros para a Excelência, envolvendo todos os setores administrativos e assistenciais. Iniciou-se um ciclo virtuoso de Planejamento Estratégico, em vigor até hoje, que contempla as perspectivas gerais, econômicas e financeiras, de cliente, processos e tecnologia e pessoas. Os objetivos estratégicos estabelecidos em cada perspectiva por meio de um planejamento anual com revisões semestrais são transformados em metas setoriais para todo o hospital, inclusive para o corpo clínico.
De forma pioneira, no início dos anos 2000, trouxemos o médico para o centro da gestão. Num hospital lidamos com pessoas que estão passando por momentos ímpares em suas vidas, seja a expectativa pelo nascimento de um filho ou a esperança de ter sua saúde restabelecida. A razão de existir de um hospital é o nosso cliente e para isso é tarefa dos gestores – administrativos e assistenciais – garantir que essa estrutura complexa esteja pronta e saudável para que o cliente tenha suas necessidades atingidas.
Muitos dizem que o médico não consegue aderir a processos gerenciais que trabalham com técnicas de planejamento estratégico. Estas técnicas incluem a habilidade para lidar com diretrizes, metas, indicadores, planos de ação e outros dispositivos que, em última análise, permitem que a performance clínica possa ser medida e, consequentemente, acompanhada a fim de que desvios possam ser corrigidos e acertos possam ser reforçados positivamente.
O paradigma de que o corpo clínico não se interessa e não se envolve com as questões gerenciais foi quebrado. A participação das diversas clínicas do Mater Dei se dá de maneira ativa com elevada contribuição das equipes para a melhoria constante dos resultados.
Certamente esta mudança de cultura só foi possível porque os médicos se sentiram parte integrante desta estratégia e por terem se sentido um agente ativo na construção deste novo modelo de gestão de corpo clínico que é parte da Governança Clinica do Hospital Mater Dei. Daí se pode concluir que é possível a aplicação de métodos gerenciais usados na gestão administrativa de corpo clínico com resultados surpreendentes quanto ao aumento da eficácia assistencial e gerencial, acompanhado de aumento de eficiência.
Hospitais e médicos nunca deixarão de existir. A integração do corpo clínico com a gestão das organizações hospitalares é hoje imprescindível para a sustentabilidade do setor. Acreditamos que quanto mais entrosados estiverem, respeitando as suas respectivas autonomias, utilizando sistemas de aferição consagrados pelas ciências gerenciais e respeitando a diversidade dos seres humanos, mais preparados estarão para apoiar e atender com carinho e qualidade aqueles que os procuram em momentos de fragilidade física e emocional.